Onda de violência na sociedade árabe é um desafio estratégico para Israel 
08 maio 23

Onda de violência na sociedade árabe é um desafio estratégico para Israel 

Revital Poleg

Por Revital Poleg

A sociedade árabe em Israel está sangrando, lutando pelo direito básico de viver com segurança pessoal. Desde o início de 2023, e até o momento, 73 mulheres, homens e crianças da sociedade árabe foram assassinados. Os números continuam crescendo quase diariamente, batendo recordes assustadores como nunca antes conhecidos, e o fim disso nem está à vista.

O sentimento de desamparo que o público árabe experimenta, combinado com a falta de ação por parte do governo (ou ação limitada e, sobretudo, muita retórica), gera o desespero entre eles, o que gera uma perda total de confiança nas autoridades governamentais – o resultado é a indiferença. 

Essa é uma perigosa reação em cadeia que afeta, em primeiro lugar e acima de tudo, a sociedade árabe, mas também a sociedade israelense inteira, e é essencial freá-la com urgência. 

Não é menos importante do que deter o terrorismo e prevenir outras ameaças de segurança.Por enquanto, isso não está acontecendo. Foi Itamar Ben Gvir que prometeu, durante as recentes eleições, restabelecer a governança e trazer paz e segurança completas nas ruas israelenses se ele fosse nomeado Ministro da Segurança Interna. 

Essa promessa levou muitas pessoas, mesmo aquelas que não apoiassem a ele nem ao partido, a votar nele, possibilitando que ele obtivesse a posição que tanto desejava. 

Para ser sincera, eu não apenas não esperava nada de Ben Gvir, muito pelo contrário! Fiquei assustada com o que ele traz e representa: extremismo, racismo, falta de profissionalismo e de responsabilidade. Infelizmente, a realidade mostra que minhas preocupações (e as de muitos) não são infundadas. Por maiores que fossem as promessas dele, maior é o fracasso que estamos testemunhando. 

Atualmente, não existe um diálogo entre o Ministério da Segurança Nacional e os dirigentes das autoridades árabes. Sem tal diálogo, não só será muito difícil conseguir melhorias, mas é assustador imaginar o quanto podemos nos deteriorar. Ademais, cinco meses após assumir o cargo, o ministro ainda não encontrou tempo para visitar a Divisão de Polícia para a Prevenção de Crimes na Sociedade Árabe, o que demonstra claramente suas prioridades. 

Na situação atual, a polícia está enfrentando um desafio múltiplo para conquistar a confiança do público árabe. As autoridades continuam com os esforços para combater a grave violência, porém está longe de ser suficiente. Os desafios são muitos e não começaram neste governo: a luta sísifa contra o crime organizado, a violência doméstica, a manutenção da ordem pública em períodos de tensão de segurança e muito mais. O apoio ministerial inequívoco, em uma realidade tão complicada, é nada mais que essencial.

Era lógico supor que o primeiro-ministro instruiria o ministro a liderar um esforço de emergência para combater essa onda crescente de violência, já que se trata de uma questão de salvar vidas. Porém, também é lógico presumir que em vista da deterioração de Ben-Gvir nas sondagens recentes, e a crescente tensão política entre os dois, Netanyahu não vai ajudar Ben-Gvir a sair dessa situação apoiando suas ações. 

Além disso, quando o próprio primeiro-ministro coloca a reforma judicial no topo das prioridades do governo e deixa de lado todas as outras questões fundamentais, tal como essa que se refere à vida humana, incluindo a vida de crianças, mulheres e outros cidadãos inocentes, não é de admirar que a violência esteja crescendo.

Por mais que o governo de Bennett-Lapid tenha durado pouco, uma das realizações deles foi o plano “Safe Route” (Rota Segura) para erradicar a violência e o crime no setor árabe, liderado pelo vice-ministro de Segurança Interna, Yoav Segalowitz.

Nesse contexto, um diálogo de confiança foi criado entre os líderes do programa e os líderes da sociedade árabe. A cooperação já começou a dar resultados: enquanto o ano de 2021, que foi considerado muito difícil, acabou com 126 assassinatos, em 2022, o número diminuiu para 116 vítimas (8% a menos). Mas desde o início deste ano (2023) e paralelamente à posse do atual governo, o número de pessoas assassinadas aumentou mais de três vezes em comparação com o período correspondente do ano passado. Os dados são alarmantes e há, sem dúvida, motivo para preocupação. O número crescente de incidentes de tiroteio em plena luz do dia, nos centros das cidades e bairros residenciais, indica que todas as linhas vermelhas foram cruzadas.

Na ausência de um “adulto responsável” no governo atual, é de esperar que alguém aja conforme o apelo do Presidente Herzog nesta segunda-feira, 8 de maio, dizendo: “Estamos em um momento de emergência. A onda de violência é um desafio estratégico para o Estado de Israel.” De acordo com ele, “este é um terrorismo civil que ameaça a todos nós. Apelo a todos os responsáveis para que convoquem urgentemente discussões de emergência, tomem decisões decisivas, parem com os temores e as escusas, atuem com todos os meios e liderem uma guerra sem concessões, que erradicará essa ameaça, e imediatamente”.

Em dias de governo de extrema direita, de ameaça da revolução jurídica e preocupação com suas consequências, o público árabe se sente encurralado e à margem do discurso público. Muitos deles acham que a violência desenfreada não interessa realmente ao público judeu, que, no melhor dos casos, balança a cabeça quando ouve outra notícia sobre o novo assassinato do dia. Uma minoria enfraquecida e vulnerável não se sente parte do país em que vive. Seu silêncio é estrondoso e não podemos ignorá-lo. 

É nosso dever moral e cívico levar a questão à pauta pública e exigir do governo que assuma responsabilidade imediata e abrangente.

Artigos Relacionados

Aproximação perigosa: A nova política de Israel com a extrema-direita europeia
Aproximação perigosa: A nova política de Israel com a extrema-direita europeia

Calendar icon 5 de março de 2025

Revital Poleg Em uma decisão altamente preocupante, o Ministro das Relações Exteriores de Israel, Gideon Sa’ar, anunciou, em 27 de fevereiro, a suspensão do boicote a três partidos conservadores europeus associados à extrema-direita: a Frente Nacional, na França, liderada por Marine Le Pen; os Democratas Suecos, na Suécia; e o partido VOX, na Espanha. Paralelamente, […]

Arrow right icon Leia mais

Em memória de Shimon Peres, o sonhador realista

Calendar icon 27 de setembro de 2018

Leia artigo de Revital Poleg

Arrow right icon Leia mais
Três décadas de ignorância
Três décadas de ignorância

Calendar icon 27 de novembro de 2024

Em texto publicado no dia 25 de novembro na Folha, o ex-ministro Carlos Marun alega que o conflito atual entre israelenses e palestinos teria tido seu início há quatro décadas. O marco fundamental, para Marun, foi o assassinato do ex-premie de Israel, Isaac Rabin, e a consequente eleição de Netanyahu que, segundo as palavras do […]

Arrow right icon Leia mais